Tempo Perdido


De Alexandre Valério Ferreira


  De tijolo em tijolo, eu construía a mim. A cada novo dia, concretava ideias, pensamentos, crenças. Parecia tudo firme, sólido, estável. Tudo se encaminhava para tomar a forma tal qual o arquiteto projetara.
  Mas, em um impulso de razão, tudo foi arruinado. Tantos anos tentando construir aquelas relações. Quanto empenho em vão! O que era concreto se tornou incerteza. O chão firme já apresentava rachaduras.
  Naquele momento da minha vida, a impressão que eu tinha é que já estava tudo perdido. O tempo não volta. O que estava feito, não podia ser mudado. E o que deveria ter sido mudado, não foi feito no tempo.
  Desistir? Não podia também. Era fácil demais. Consequências? Havia de arcar com elas. Fugir? Tola ilusão. Esperar? Já fiz demais. Acreditar? Em quê era o que precisava saber. Trágico? Sempre é.
  A obra estava embargada, pelo menos para mim. Na verdade, ela estava em atividade. A cada dia, o tempo e o vento insistiam em raspar cada pedaço, deteriorando, decompondo. Não, a obra não para; ela avança ou regride. 
Não podia simplesmente clicar em parar e tentar reiniciar a fita. Estava tudo perdido, então? Como eu disse, isso estava fora de cogitação. O que fazer então? Sair da ilusão de que estava tudo bem. Demolir o que estava errado. Reutilizar o que ainda prestava.
  O tempo não permite volta. Só andamos para frente. Como disse um pensador: "Ninguém entra em um mesmo rio uma segunda vez, pois quando isso acontece já não se é o mesmo, assim como as águas que já serão outras."(Heráclito)
   Mas, se as águas já são outras, o rio não é o mesmo, nada é o mesmo, como posso achar que está tudo acabado? Acreditar que nos planos já perdidos no tempo indicam fracasso era uma tolice. Precisava me reconstruir. Foi tempo perdido? Foi. Mas, o passado pode estar consumado, mas o futuro ainda precisa ser feito. Não está necessariamente perdido.

 

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