A Entrada Principal



De Alexandre Valério Ferreira


  A pintura, desgastada pelo tempo e pelo esquecimento, descascava. Da janela, as vidraças perdiam a transparência. Se tornavam opacas, inúteis. As esquadrias das portas, abandonadas pela falta de manutenção, eram perfuradas por insetos e, dia após dia, se tornavam em grãos de pó.
  Era assim que a entrada principal daquele casarão se encontrava. Pouco se sabia de seus moradores. Apesar de viverem ali a meio século, eram pouco sociáveis. Lacônicos, de poucas palavras. Sorrisos amarelados, desbotados, pouco sustentáveis, tímidos. Aquela família era estranha.
  Estranho também eram seus vizinhos. Todos desconhecidos. Cada um na sua. Ninguém era de hábitos noturnos. Apenas se escutava o som da televisão exibindo as novelas e sorteios. Fora isso, tudo se resumia ao silêncio. No mais, se ouvia o chiado de cadeiras balançando.
  A cidade envelhecera ali. Antes, aquele bairro era a entrada principal da elite. Todos que subiam de classe social, compravam uma residência ali. Era um símbolo de status. Era sonho de consumo de toda uma geração.
  Com o passar dos invernos e verões, a entrada principal ficara similar à porta dos fundos. Os velhos, com interesse descolorido pelo futuro, viviam na espera do passado. Já não queriam olhar para frente. Não se sentiam bem. Só olhavam para trás, para os chamados "bons tempos".
  As casas seguiam seus donos. Não queriam mudar. Gostavam da estagnação, ou pelo menos, se acomodaram com ela. É fácil parar. É fácil desistir. Dói menos, ou é o que parece. No fundo, a tristeza é maior, pois o passado vai sendo apagado com a falta de interesse por um futuro.
  Queria que aquela entrada principal fosse preservada. Mandei um pedido ao IPHAN. Quando será que agirão? Não faço ideia. As construtoras, com seus tratores de dentes mordazes, estão ansioso por mais uma casa velha a menos. E cada passado esquecido, mais reais em suas contas.






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