Da Ponte



De Alexandre Valério Ferreira



  Da ponte, eu via o tom verde esmeralda do Velho Chico. Entre ravinas e desfiladeiros, ele caminhava tranquilamente, acompanhado de seus afluentes, que de forma aparentemente insignificante o nutriam.
  Da ponte, eu via Paulo Afonso. Mas, não era aquele cara, mas um conjunto de usinas hidrelétricas. Nelas, o Velho Chico pedalava e fazia rodar as casas a milhares de quilômetros daqui com eletricidade.
  Da ponte, perdia a vista na caverna onde reza a lenda, Lampião tentou se esconder. Virgulino era mais cheio de interrogações do que vírgulas. Até hoje, é uma figura contraditória. Um indivíduo paradoxal, beirando a loucura, o ódio e a compaixão.
  Da ponte, observava os carros e caminhões trilhando seus rumos. A cada um que passava, uma forte pancada de ar me assustava. Cair daqui não seria interessante. Muito provavelmente, não cairia nunca mais na vida.
  Da ponte, eu observava a ponte que ligava mundos. Mas, também os separavam. Distanciava o medo da fuga, da desistência. Afinal, bastaria uma pequena vontade para sair daquela cidade-ilha. Bastava um deslize para se banhar loucamente nas esmeraldas águas do Velho Chico.
  Da ponte, imaginei estar no topo de tudo. Acima dos penhascos e medos. Mas, bastava uma carreta atravessar e vibrar a estrutura metálica para eu fincar meus pés no chão e me aperceber o quão sem base eu poderia estar a qualquer momento.
  Da ponte, eu conseguia entender que a vida é dessas coisas. Que muitas vezes nossa arrogância é excesso de ignorância. E nossos temores se embasam na mais racional das sabedorias de minha mente. A vida é desses paradoxos.



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