As coisas não são lineares

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De Alexandre Valério Ferreira



  A pessoa é rica? É porque ela é esforçada. É pobre? é porque não teve oportunidades. Alguém é chato? É porque é mal amado. É sorridente? É porque não vê as coisas ruins que acontecem. Simples assim.
Gostamos de simplificar tudo. Melhor dizendo: apreciamos ter essa ilusão de que somos capazes de e necessitamos da compreensão de tudo que acontece no mundo real. Pode ser decepcionante para alguns, mas a realidade não é bem do jeito que nós queremos.
  Ela não é exatamente como queremos, tanto para mais como para menos. Entretanto, nós tendemos a negar isso. Não aceitamos as coisas tais quais elas são, o que aumenta nosso tormento. E, em consequência, geram-se lutas desnecessárias, inimigos imaginários, dores inúteis.
  O mundo e o universo não funcionam linearmente. O que isso quer dizer? Significa que a vida não é uma equação de primeiro grau. Lembra? Se y é igual a x mais 1. Então, caso x seja igual a 2, y será igual a 3. 
  Note a similaridade com nossos pensamentos cartesianos. Se alguém não fala comigo, é porque ela me despreza. Se alguém não fala comigo, é porque eu não presto, sou desagradável. Se alguém não fala comigo, é porque ela é uma idiota, desagradável. Se alguém não fala comigo, é óbvio que todos no planeta são do mesmo jeito, ou seja, desprezíveis. Sempre relações diretas, inevitáveis.
  As coisas, porém, não funcionam dessa forma. Na verdade, isso é uma tentativa de adaptar a realidade aos nossos pensamentos e desejos, o que pode ser destrutivo. Até mesmo um caminho para a insanidade. 
  Quantos atos na história humana ocorreram devido ao pensamento linearizado? Vide a influência do positivismo, tentando lidar com o comportamento humano da mesma forma que os cientistas faziam experimentos nos campos da física e da química. Tem lógica? Aparentemente sim, mas a realidade provou que não. 
  Sim, gostamos de tornar tudo preto no branco. Queremos linearizar. Claro que isso não é necessariamente ruim. É natural, muitas vezes. Útil em diversos momentos, pois necessitamos de um chão para pensar e agir. 
  Mas, não podemos negar que somos influenciados por diversos fatores. Não somos completamente imparciais e nem devemos, muitas vezes. É essencial, entretanto, possuir uma mente aberta e saber reconhecer quando estamos errados. Além disso, um fenômeno não é um ato isolado. Possui contexto. Costuma ser apenas a ponta do iceberg de problemas e situações mais profundas e antigas. 
  A questão que procurei levantar é que as coisas não são sempre como nós imaginamos. Na verdade, "imaginamos" demais. Deliramos em pensamentos "racionais", que no fundo são influenciados por medos, desejos e emoções escondidas. Devemos ter cuidado.
  Interessante notar como as pessoas sábias agem. Os jovens e principiante costumam usar muitas afirmações, em qualquer campo do conhecimento humano. Gostam de dizer que "é assim", "com certeza", "sem dúvidas", etc. Com o amadurecimento, deixam de agir assim e começam a dizer termos como "parece que", "pelo que me parece", "pelo que tudo indica", "provavelmente", "eu vejo que", etc.
  Por que essa mudança? Porque a medida que ganhamos experiência e compreendemos melhor a realidade, percebemos o quão pouco sabemos e somos capazes de aprender. E notamos que não é correto fazer julgamentos precipitados. Todos nós deveríamos alcançar esse nível de desenvolvimento. Seria muito bom, não acha?



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