Rosto

Auto-retrato, 1889, Van Gogh. Foto: 3.bp.blogspot.com/_tWYzp3y4ZO8/TNdLfy-lLpI/AAAAAAAAALU/1Aueyqcfk_A/s1600/Gogh+1889+AR-.jpg.
  
Seu rosto era como um diário. Revelava seu passado. Facilmente se percebia em sua face o desgaste do tempo. Poderia se imaginar que antes fora uma bela mulher. Conservava uma fisionomia singular, cuja beleza o passar dos anos fez questão de enferrujar. As rugas apareceram. Ela aparentava cansaço e um pouco de tristeza. Seria decepção, frustração ou ansiedade?
  Ela parecia ter uns 40 anos, mas dizia ter uns 30. Andava com duas crianças: um menino de 8 anos e uma garotinha de 4 anos de idade. Pelo visto era mãe solteira. Afinal, das poucas vezes que a vi, nunca foi com algum namorado ou marido. Se bem que muitos homens são pais ausentes. Isso é uma triste realidade. Natural, portanto, que muitos órgãos do governo perguntem principalmente pelo nome de nossas mães e não de nossos pais.
  Não podia negar, entretanto, que ela fosse batalhadora. Seu rosto era sério, firme. Metia medo até para outros homens. Mas, para seus filhos, era um olhar terno e protetor. Sim, aquela mulher era uma lutadora. Infelizmente, tais mães tem desaparecido ultimamente. Pelo menos, é a impressão que tenho. Digo isso porque muitos pais e mães estão se tornando ausentes. Considera os filhos como um estorvo, uma carga inútil mas obrigatória. Outros, gastam tanto tempo trabalhando que esquecem dos filhos.
  Mas, o olhar desta mulher revelava outra pessoa. Ela tinha um ar de sabedoria e de bondade. Queria o melhor para os filhos e, por isso, levava eles para a escola. Escola esta que não era perto. E, para ficar pior, ela não tinha muitas condições e não havia transporte escolar na época. Mas, ela não desistia. Levava as crianças mesmo assim. Dizia que desejava um futuro melhor para os filhos.
  Sim, a fisionomia dela tinha as marcas da vida. Marca das raivas e decepções. Revelava sua humildade e sua timidez. O mundo fez ela se sentir inferior? Não sei. As pessoas vivem tentando rebaixar os outros a fim de aumentar seu ego ou compensar sua própria baixa autoestima. Não, não acredito que ela se sentisse inferior. 
  Talvez só tivesse vergonha, timidez, medo do que poderiam dizer. Mas seu rosto revelava a sua firmeza, sua bravura, em meio a este mundo injusto. Revelava que ela não desistiria nunca.


Alexandre Valério Ferreira





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