O Foragido

 
Foto: http://harukakun.blogspot.com.br/2015/06/vai-fugir-para-onde.html


De Alexandre Valério Ferreira

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EU ESTAVA tentando me tornar um foragido de mim mesmo. Queria fugir de tudo que me doía, que me machucava. Estava cansado da angústia do medo da derrota. Não queria ouvir o que sabia que não seria bom.
  Mas, aos poucos fui percebendo que ser fugitivo não é tarefa fácil. Tentei sorrir e dizer que estou bem, mas o disfarce não enganava os outros, conscientemente ou não. Eu me embriaguei na música, procurando viajar para longe de mim mesmo, longe de alguém que eu já não gostava que era eu mesmo. Ainda assim, não era capaz de encontrar a paz nos fones de ouvido.
  Continuei fugindo. Corria para festas e eventos. Super lotava minha agenda de atividades. Procurava trabalhar mais do que o normal. Queria fazer mais e melhor. Não queria voltar para casa. Meu lar não era nenhum lugar.
  Ainda assim, não conseguia escapar. A angústia me encontrava. Eu me encontrava e de mim não podia mais esconder-me. Percebi então que nunca consegui escapar. Que a "fuga" era uma ilusão e os problemas internos estavam do meu lado todo instante. 
  Foi nessa hora que percebi quão tolo foi ser um foragido de si mesmo. Renegar o inevitável era uma tentativa de aliviar um desafio do qual não se pode escapar. Tentar escapar de si mesmo é a pura irracionalidade provocada pelo medo, que cega os neurônios e o juízo. 
  Tive de me aceitar. Não era o mesmo que se entregar à polícia e ficar trancafiado. Não, no momento que deixamos de fugir, na procura de uma ilusória liberdade, na verdade, encontramos a paz mental.
  Era nessa fuga que estive por muito tempo. Escondendo de todos e de tudo que eu estava correndo, tentando escapar. Não queria parecer vulnerável. Eu parecia aquele cara da canção do Renato Russo e tentava "provar para todo mundo que não precisava provar nada pra ninguém". 
  Tive que olhar no espelho. Tive de me encarar. Reconhecer aquilo que sou e o que pretendo ser. Era um processo inevitável e contínuo. Aceitar-se. Compreender-se. Autoconhecimento. Autoconsciência. Doloroso, mas necessário. Difícil, mas gratificante.
  Quando deixei de ser foragido, descobri então que nunca precisava estar correndo. Já andava devagar. Já sentia o gosto de cada instante. Não tinha mais pressa. Eu me lembro da resposta do coelho à Alice, quando esta lhe perguntou sobre quanto tempo durava o eterno. Ele explicou: "Às vezes, um segundo".


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