Diário de um Empurra-Empurra

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De Alexandre Valério Ferreira

  Foi uma tragédia social. Tudo começou com um empurrão. Não se sabe da parte de quem. Impossível descobrir com tantas pessoas tentando entrar no ônibus.

  Era uma manhã de abril. A fila começou a ganhar tamanho rapidamente. Por outro lado, o ônibus não aparecia. Boatos diziam que um acidente na avenida principal congestionou o trânsito e as engrenagens da cidade travaram.

  É evidente que todos estavam apressados e não consideravam em hipótese alguma que chegariam atrasados ao seu trabalho, sua escola, sua consulta, seu exame, seu isto e seu aquilo. Todos tinham motivos para estar ali (ou, pelo menos a maioria deles).

  Tensão e ansiedade começa a dominar o ambiente. A cada instante, a fila se comprime mais. As pessoas mais próximas fisicamente, porém, mais distantes socialmente. 

  A fila é uma mentira. Não existe esse fenômeno social nos terminais. Só embriões dela. Quando o ônibus chega, as duas filas paralelas tornam-se em um amontoado caótico.

  Sim, bastou o ônibus se aproximar e o empurra-empurra começa. Não se sabe a origem, mas ele ganha maior força sobre os primeiros da fila. Sobre eles recai as oportunidades dos melhores lugares e o risco das piores quedas.

  Mas, naquele dia, um desastre aconteceu. No empurra-empurra, naquela ânsia de entrar e de chegar na hora no trabalho, ninguém se feriu. Nenhum deles se cortou. A maioria conseguiu entrar e o ônibus partiu lotado.

  E cadê a tragédia? Este é o desastre. Tudo pareceu normal. Era como mais um dia qualquer. E o irracional ganhou aquela batalha. Triste e doloroso foi ver. Tive que me resignar e esperar o próximo ônibus e seguir com os empurrões. 

Fim