A Lanchonete


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MOTA foi para uma das mesas que estavam mais afastadas. Ele puxou a cadeira de plástico e desmoronou-se. A mochila foi arremessada para o chão. Fez um barulho característico de vidro estilhaçado. Algo deve ter se quebrado dentro dela, mas Mota não teve nenhuma reação que revelasse preocupação.
   Não sei bem o que se passava na cabeça dele. Mas, com toda a expressividade que demonstrava, pensamentos positivos não deviam ser. Talvez por isso que ela tenha ido para a cantina. Ansiedade e estresse provocam fome, muita fome.
   Pediu um salgado. Era daqueles que escorriam litros de óleo pelos braços. Comeu rapidamente, como se fosse a última vez. Parecia até que estava com fome. Depois de limpar a boca com a própria mão, ficou imóvel.
  Seus olhos procuravam um local para não olhar. Desanimado, olhava para o tic tac do relógio. Tentava senti as horas passando. Retornar parecia inviável agora. Precisava respirar. Tinha que se recompor. Sabia bem que errara feio, mas não estava com humildade suficiente para aceitar.
  As meses foram se esvaziando. O intervalo de lanche acabara. O vento enxotava os guardanapos que ficaram esquecidos nas mesas. Os pardais, sabiás e bem-ti-vis se aglomeravam nas proximidades, caçando pedaços de comida no chão. O tempo de Mota acabou e o deles começou.
   Subir as escadas parecia um desafio impossível. As mãos continuavam oleosas. Escorregava com facilidade através do corrimão. A fome sumira momentaneamente. Parecia até que era real. Queria que os degraus não acabassem nunca. 
   São nesses momentos que ficamos indecisos entre o ir para frente ou para trás. Procrastinamos o enfrentamento. Aceitar os erros para os outros é complicado, especialmente para si mesmo. Nosso auto-julgamento costuma ser mais agressivo do que dos outros. Mota era desses que se exigiam demais com medo de ser alguém de menos. No final, fazia de menos tentando ser algo de mais.


De Alexandre Valério Ferreira


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