A Janela Rosada - parte 2

Casa rosada. Foto: autor.

  A solidão é um dos piores sentimentos. Somos criaturas que precisam de socialização, relacionar-se com outros de nós. O desprezo, a apatia, o descaso, são formas lentas e crueis de fazer alguém sentir-se inútil e rejeitado. Geralmente, isso se dá por diferenças nas características físicas ou origem do indivíduo rejeitado. Ainda é comum preconceitos, como racismo, xenofobia, entre outros.
 Mesmo num país miscigenado, ainda há um enorme preconceito contra negros e pobres. Ana Cecília, a nova moradora de Vila das Dores passava por isso. Não por sua cor ou condição financeira. Mas, por ser diferente. Criou-se no local uma série de "padrões" e estes deviam ser seguidos. Quem criou tais padrões? Não se sabe. Porém, a vila toda os seguia, com exceção da nova moradora.
  A princípio, ela associou a apatia local com timidez. As pessoas são tímidas  Tem medo de errar ou de causar uma má impressão. Era isso que ela imaginava. Com o passar do tempo, mesmo a mais alegre das pessoas, pode acabar se desanimando e aceitando o que os outros impõe. Outros moradores mais antigos também passaram por esse trauma inicial, mas, como é prática da maioria das pessoas, acabam seguindo a multidão e se tornou mais uma moradia comum em Vila das Dores.
  Cecília tinha sonhos. Queria seus filhos felizes. Queria que eles amadurecessem de verdade. Porém, não existe maturidade em quem não compreende e não sabe lidar com as diferenças. Porque esses padrões inúteis? Existem padrões corretos, como o do formato de tomadas elétricas, dos aparelhos de segurança de um carro ou dos itens de emergência num local público. Porém, algumas pessoas criam mecanismos retrógrados e ,devido ao orgulho, não admitem os seus erros.
  Para sobreviver naquela ilha social, ela se sustentava por meio de seus filhos. Ao contrário de muitos de lá, ela via seus filhos como amigos, mas ainda assim, mantinha sua autoridade. Os vizinhos não gostavam disso. Porém, Cecília precisava de amigos e na vila das Dores, a dor mais comum era a solidão. Parecia que todos sentiam solitários. Ela comentou isso para alguns, mas ninguém admitia. Apenas se concentravam nos "erros" daquela família atípica.
  Às vezes, a solução está fora. Assim, para manter a alegria, nada melhor do que o telefone. Ana mantinha contato com seus amigos. Ela era contente e lutadora, mas não ter com quem conversar é a pior das dores. Talvez, quem sabe, seja esse o motivo de terem dado esse nome ao local. Mas, ela conseguia superar. Era longe dali que encontrava alegria. Seus vizinhos se espantavam com aquilo.
  Bem, passaram-se alguns anos. Não vou dizer que as pessoas de Vila das Dores notaram quão bom era ser gentil e razoável ou que passaram a gostar de Ana Cecília e seus três filhos. Alguns ainda evitam sequer olhar para ela. Mas, a maioria passou a lidar com isso de forma mais racional. 
  Outros, passaram a compreender Cecília e ela compreendia eles. Dificilmente deixariam de ser metódicos e retrógrados em alguns aspectos. Mas, ela deixou de ver isso de forma tão negativa, encontrando pontos positivos naquele vilarejo. Talvez esse fosse seu segredo para sorrir sempre.



Alexandre Valério Ferreira




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