O menino que tinha vergonha da sua cor

  
Contra a cultura do racismo. Imagem: http://wp.clicrbs.com.br/vivi/files/2014/04/racismo.jpg

Era uma vez um garoto. Ele morava na periferia e era feliz. De vez em quando ia a praia, tinha bons amigos e gostava de ler. Seus pais se esforçavam em lhe dar boa educação por pagar uma escola particular. Ele amava ver filmes. Era um garoto comportado. Entretanto, em um não tão belo dia, um pensamento veio a perturbar sua doce tranquilidade. E a tal ideia não lhe saia da mente.
  O problema é que esse garoto se percebeu que não era branco. Era moreno, não era de pele tão escura, mas também não muito branca. Era uma espécie de meio termo, uma miscigenação de cores. Ele nunca se tocou para isso antes não? Talvez sim, talvez não. Mas, só foi quando tinha uns 12 anos que ele se incomodou com isso.
  Espera, ele era racista? Não. Alguém de sua família era? De forma alguma. Tinha amigos racistas? Não que soubesse. Então, porque tal criança ficou incomodado com a ideia de não ser de cor branca? Bem, por sempre ver TV e ler bastante, teve uma impressão de que todos eram brancos. Também associou pessoas brancas com boa condição financeira.
  Afinal, quantos filmes, novelas e programas de TV haviam nos quais o apresentador ou ator fosse negro? Contava-se nos dedos. Eram raros, deveras. Quando havia, geralmente tinham papeis coadjuvantes, irrelevantes. Se ver bem, em muitas novelas há empregas que são negras e com pouca educação. Era um verdadeiro estereótipo. E quando ia para a beira-mar, para os bairros mais nobres da cidade, raramente via pessoas negras. Ao contrário da periferia, que geralmente era esquecida pelo poder público. De fato, haviam diversas razões para ele ter a impressão de que fosse ruim ser moreno. Não poderíamos condenar o pobre garoto.
  Assim, o menino quis parecer mais claro. Tentou evitar pegar sol. Queria fazer o que Michael Jakson fez. Mas, para sua temporária infelicidade, aquilo era impossível. Entretanto, com o passar do tempo, o discernimento foi tomando conta dele. Percebeu que no país em que vivia, a grande maioria eram negros ou morenos. Entendeu então a questão cultural, o preconceito impregnado e discretamente disseminado em toda a sociedade. Sentiu vergonha das ideias anteriores e passou a ser feliz do jeito que era.


Alexandre Valério Ferreira



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