Diário da borboleta

Borboleta. Foto: Autor.
  O sol está nascendo. O tempo está agradável. Tenho que ir logo a procura de algumas flores. Não posso esperar muito, pois logo o clima vai ficar muito quente, insuportável. Além disso, o movimento de humanos complica meu trabalho. Vivo numa cidade. Cidade é um local cinza onde moram seres humanos amontoados. Muitos deles são infelizes e gostam de se torturar.
  Tive sorte no começo. Eu estava no meu casulo, ainda demorava um tempinho para estar pronto. Mas, começaram a construir casas no local que antes tinham muitas árvores. Consegui eclodir 1 dia antes de toda a mata ser destruída. Foi triste. Mas, fazer o quê? A fome era grande e tive que procurar néctar longe dali. Nem sei mais onde nasci.
  Reza a lenda que haviam muitas flores por essas bandas da cidade. Mas, começaram a construir mais casas e prédios. Odeio os prédios. São barreiras imensas. É uma tortura ultrapassá-las, mesmo que seja pela lateral. Já vi muito pássaro morrer por causa dos vidros. Vidros são mecanismos de aprisionamento nos quais temos a ilusão de que estamos livres. 
  Já entrei uma vez em um dos casulos humanos. Eles os chamam de apartamentos ou algo parecido. Em relação ao tamanho deles, são miúdos. Bem, só sei que tinha esse tal vidro. Por mais que eu batesse, não consegui quebrá-lo. Nem mesmo consegui distinguir a saída. Foi um sufoco e tanto. E, como não era sofrimento suficiente, apareceu um gato. Felizmente, um humano abriu a janela para jogar lixo do alto e eu pude sair.
  E as tais caixas ambulante? Elas são perigosas! Podem nos matar também! Além disso, elas soltam uma fumaça que é tóxica. Parece que os humanos se dão bem com a fumaça preta, pois cada vez mais produzem essas caixas ambulantes. Vai ver eles respiram isso ou talvez tornem os pulmões deles mais saudáveis. Eu não sei. Só sei que preciso de néctar!
  Falando em néctar. Está tão escasso. O problema são as flores. Cadê elas?! São cada vez mais raras. Vejo muitas de mentira. Sério! Os humanos são ruins: destroem as de verdade e colocam as de mentira. Se não, só colocam as flores. Aí é chato, pois elas estão morrendo... Estou com fome e tenho sobrevivido como posso. 
  É difícil ver outras da minha espécie. A salvação é um pequeno jardim de uma velha senhora humana. Os outros de sua espécie a chamam de doida. Não entendo. Será que é porque ela cultiva um jardim e nos serve de abrigo? Não sou preconceituoso, mas humanos são uns bichos muito estranhos.



Alexandre Valério Ferreira



 

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