Diário de uma Emergência

IJF, Fortaleza. Foto editada pelo autor. Fonte:http://www.totalclipping.com.br/v1/docs/noticias/g/186.jpg
   
   A viagem era longa. Ela já sabia que o dia seria cansativo. Não era nem preciso dizer que seria necessário muita paciência. O dia estava quente e o menino estava chorando. Ela tentava acalmá-lo. Dizia repetidas vezes que tudo estava bem. Será que estaria mesmo? Bem, ela não sabia, só podia desejar que estivesse. A ambulância saiu de Tauá 7:00 horas da manhã e chegou por volta das 12:30 da tarde em Fortaleza. Ela nunca estivera em Fortaleza até então.
    Evidentemente, não havia escolha. Em Tauá não se resolvia seu problema. O garoto engolira uma peça pequena de um brinquedo. Pelo visto ficou preso ninguém sabe onde. O clínico da cidade encaminhou para o IJF, o maior hospital de emergência do estado do Ceará, pois na sua cidade não havia como retirar. Imagine se fosse engasgamento sério? Teria alguma chance? Melhor nem pensar.
   Fortaleza é grande. Tauá é equivalente a uns dois bairros da capital cearense. O trânsito é terrível, mas finalmente chegam ao hospital. Era imenso. Ela nunca havia visto um prédio daquele tamanho antes. Desorientada, ela entra no local errado e com a ajuda de algumas pessoas, finalmente encontra a entrada da emergência. 
   É encaminhada para a Endoscopia. Que nome estranho, pensou ela. Tomara que dê tudo certo, pois era tudo que ela queria. Ver o filho sofrendo é uma das piores dores que um pai ou uma mãe podem sentir. Não tem nem como explicar.
    As cadeiras eram de ferro. Eram frias. O ambiente é frio. O corredor não tinha tanto movimento, o que era bom. Existem setores lotados, onde é impossível ter um pensamento silencioso, tranquilo. 
   Para tristeza da mãe e seu filho, médico só apareceria a noite. Como acalmar o filho enquanto isso? E quando alguém reclamava ou aparecia alguma criança chorando? Nessas horas ficava difícil dizer para o filho que ficaria tudo bem. Mas ficaria, não é? Tinha que ficar, pensava ela.
   Em hospitais públicos, é comum a falta de médicos, o atraso destes e a falta de equipamentos apropriados. Bem, neste a situação não era diferente. Tem como ser mais frustrante que isso? 
     Ela nem gostava de pensar, porque, no final das contas, as coisas sempre podem piorar. Melhor pensar positivo. Nesse meio tempo, uma enfermeira encheu uma luva como se fosse um balão e deu para o garoto. Foi muito engraçado, pois ele estava chorando muito. 
  E, com aquela pequena ação, a criança simplesmente começou a sorrir, ficou animada e até deu gargalhadas com o "brinquedo" novo. Até parecia que a dor dele havia sumido. Estaria melhor? Infelizmente não.
   Finalmente chega o médico. Mas faltavam duas coisas: o raio X e o anestesista. O primeiro foi resolvido rapidamente. Descobriu-se que o pequeno objeto se alojara no pulmão, o que tornava o procedimento mais complicado. Difícil foi encontrar o anestesista desocupado. Eram poucos e sempre aparecia uma emergência. 
   Ela descobriu que em hospital público, você precisa estar atento, perguntando, colaborando e correndo atrás das respostas. Não deveria ser assim, mas era. Depois de uma longa espera (de mais de seis horas), ele veio e o garoto foi atendido.
    Ela esperava no corredor. Estava apreensiva. Ficar nos corredores e em salas de espera de hospitais é algo estranho. Quando você conversa com os outros pacientes, acaba tendo duas sensações. A primeira é boa, pois contar seus problemas e ouvir os dos outros pode aliviar a dor, esquecer um pouco, é como se você dividisse a carga. 
    Além disso, você descobre que sempre há problemas piores que o seu, o que faz sentir-se grato pela condição em que está. Por outro lado, os relatos podem nos deixar mais ansiosos, desanimados e acabarmos aumentando os nossos problemas. Ainda existe aqueles que disputam qual o pior caso, como se fosse um competição com um trofeu que não sei qual é. E qual seria o prêmio? Não é nem preciso responder.
    Bem, depois de tanto medo, apreensão e lágrimas, o médico avisa que a criança passa bem. Ela fica muito feliz e começa a agradecer o médico dezenas de vezes. Como pode? Depois de várias horas de espera por um atendimento, bastaram-se 20 minutos para tudo ser resolvido (seria a demora uma tortura proposital?). 
   Depois do efeito da anestesia, o filho voltou a si e eles puderam retornar para casa. Nunca mais compraria brinquedo importado, pensou ela, rindo. Adeus, Fortaleza. Eram 22:30.

Alexandre Valério Ferreira.






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