Janelas que Choram



AS gotas escorriam através dos céus.  Algumas passavam rapidamente. Eu mal conseguia distingui-las. Outras, porém, ficavam paralisadas no espaço-tempo das janelas de vidro. Flutuavam. Esqueciam-se da gravidade. Permaneciam.
   As gotas distorciam o mundo. Algumas o deixava de cabeça para baixo. Outras, tornava ele menor. Tudo dependia da forma da gota. Haviam as que eram quase circulares. Mas tinham umas que pareciam-se com amebas, disformes.
   As gotas resistiam à gravidade, que tentava sugá-las para seu destino inevitável. Uma parte de si tentava manter-se coesa, arredondada, isolada. Outra parte, entretanto, sentia-se atraída pela janela. Não queria abandoná-la. Não achava que fosse capaz.
   Mas, à medida que ganhava volume, ela ia se esquecendo do seu sonho de eternidade. E a gravidade lhe puxava mais e mais. Quanto maior se tornava, menos tempo de vida tinha. Resistia até um dado momento, quando desistia e se jogava loucamente, sugando toda umidade que se impregnava na parede de vidro.
   E assim as janelas choravam. Escorriam sobre elas as gotas que em um futuro próximo formaria um ser muito maior: o mar. As lágrimas não eram salgadas ainda. Eram, na verdade, doces e agradáveis.
   Sim, as janelas choronas eram sinais de um dia maravilhoso. Daqueles em que não sentimos vontade outra que não estar na cama, tomando um achocolatado, lendo um livro e vivendo aquele incrível momento de introspecção. 
   Quando o azul dava lugar ao cinza, uma camada de calma vinha sobre mim. Tudo parava: o trânsito, o movimento, a agitação das moléculas. Parecia que estávamos a zero kelvin. O tempo seguia um outro ritmo, um ritmo que eu amava.
   Dias de chuva são simplesmente os melhores. Essa calmaria. Esse som das gotas caindo sobre o telhado. Tudo isso me transportava para outra dimensão. Lembrava-me da infância.
   Para ser específico, eu me recordava de um momento no qual eu estava no meio de uma plantação. O céu estava cinza, quase preto. As gotas cantavam sua melodia sobre as folhas. E o vento usava os galhos com violinos. As árvores tocavam sua flauta. O silêncio da natureza transcendia a loucura dos dias agitados de um mundo que pensava estar indo na direção do progresso.
   Nos dias de chuva, o abraço é mais desejado; o sono, mais agradável. Aquele suor chato demora a chegar. A pele fica mais bonita. Ficar no meio da multidão é menos incômodo. A paz fica mais próxima. Amo dias de chuva.


De Alexandre Valério Ferreira




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