A bola do mercado

Imagem: Autor.

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Naquele momento, eu caçava algo inusitado. Não sei dizer o que exatamente. Mas, queria sair do lugar-comum das fotos de frutas e verduras do mercado. Se bem que, fotografá-las é sempre interessante, pois dificilmente ficam feias. O colorido da feira alegra os olhos de qualquer um.
   Desanimado, subi o mezanino e prossegui na busca. As lojas eram todas iguais. Telhados piramidais feitos de aço e telas com buracos redondos. De repente, eu me deparo com um objeto azul. Era uma bola de futebol barata, tipo aquelas "de leite", situada em cima de uma das coberturas das barracas.
   Estaria perdida? Ou teria sido colocada estrategicamente por medida de segurança. E, afinal de contas, a quem pertenceria? Pelo que eu saiba, não havia espaço para jogar futebol no mercado. Pelo menos, não um local oficialmente destinado para isso. Afinal, qualquer lugar é campinho de futebol, seja ele um terreno baldio ou o corredor de um mercado. 
   Pertenceria aquela bolinha azul a algum vendedor? Será que os moradores de rua da redondeza a colocou escondida naquela barraca? Não descobri nada sobre. Como chegou ali, sozinha é que não foi. Só restou-me o prazer de especular, de inventar, de inferir.
   Após o fim do expediente, talvez os vendedores, que costumam ser brincalhões, tenham decidido jogar no corredor do local. E, como sempre acontece, tem alguém que não controla a própria força e chuta sem controle. Embarcou a bola. Como tirá-la sem escada? Deixa ela por lá. É baratinha mesmo. E assim ela ficou.
   Ou, quem sabe, um vendedor irritado com meninos de rua brincando na redondeza tenha escondido ela. Não é nada incomum crianças perderem o controle enquanto brincam e atingir quem quer que apareça no seu estádio de futebol imaginário. Agora, estavam sem bola.
   Seriam então dois irmãos disputando entre si sobre quem seria o dono do brinquedo? Revoltado, um deles teria jogado no telhado a bola que seus pais acabaram de comprar. Estes, cansados da falta de educação dos filhos, resolveram deixar por isso mesmo e foram embora. E lá a bola ficou.
   Ninguém parecia disposto a pegá-la, de qualquer forma. Do que valeria o esforço para alcançar um objeto tão comum e sem valor? Bolas de leite existem em todos os lugares. Ainda assim, há quem não as tenham. Nem sempre "todo mundo" significa todo mundo.
   Dias depois, retornei ao local e a bola azul não estava mais lá. Fora descoberta e capturada. Restava saber por quem. Mas, ao que parecia ninguém sequer notara sua existência. E sem a perceberam, nada disseram a respeito. A bola continuou anônima, assim como seus donos, o antigo e o atual. O mercado, então, voltara a sua rotina de vendas de frutas e verduras, de piadas e ofertas.


De Alexandre Valério Ferreira



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