Manual para Assistir TV

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Assistir TV não é para qualquer um. É necessário enxergar além do que aparece nas câmeras. Temos que perceber o que rola nos bastidores e analisar criticamente o conteúdo que nos é repassado. As teorias da comunicação do início do século XX viam a mídia como uma fonte manipuladora e os expectadores como meros baldes esperando para serem preenchidos com qualquer coisa que viesse.
   Alguns acreditam ainda que as pessoas agem assim. Outros, continuam enxergando a população como uma "massa", uniforme, onde cada um é apenas um átomo seguindo a multidão. Às vezes, somos assim, às vezes, não. A sociedade é mais complexa do que isso. A seguir, apresentarei algumas dicas de como assistir televisão sem ficar alienado, nem ser pseudo-crítico ou extremista.

   1. Entenda que existe TV pública, estatal e privada. A pública recebe dinheiro público, mas não é controlada pelo governo. Por isso, costumam ter uma programação mais independente, educativa e imparcial do que as outras redes de televisão. A estatal é um canal cuja programação é definida, planejada, gerenciada e executada pelo governo, ou seja, é um veículo de propagação dos interesses dele. A TV privada é controlada por grupos empresariais e se mantem basicamente com o dinheiro de comerciais. 
   2. A TV aberta é uma concessão pública. Então, mesmo tendo interesses privados e econômicos, ele deve visar o interesse comum. Não deveria exibir conteúdos ou reforçar ideias que desrespeitem a Constituição ou firam os Direitos Humanos.
  3. Não existe imparcialidade. É um mito. Todos tomam um lado, sempre. Então, não se engane com discursos falsos de que determinado jornal ou jornalista está acima do bem e do mal. Eles possuem interesses sempre. Alguns, mais nobres do que outros. Não exija imparcialidade, mas reclame por neutralidade, ou seja, dar o direito de voz para os lados opostos do conflito com respeito. Só porque um jornal ou programa não cita diretamente um partido político, não quer dizer que ele não os apoie ou os odeie. O enquadramento da reportagem é que indica as verdadeiras intenções deles.
   4. Opinião não é a mesma coisa de notícia. A notícia segue o principio das perguntas Quem, Fez o que, Quando, Onde, Como e Por qual razão. Ela, teoricamente, deve apresentar os dois (ou três, ou quatro, ou cinco...) lados da moeda. A opinião expressa as ideias do comentarista, ou seja, não é baseada em fatos. Pode estar tanto certa como errada. Cuidado para não se confundir. O que o jornalista acha não é, necessariamente, condizente com a realidade.
   5. Não veja programas sensacionalistas. Eles usam a máscara de imparcialidade e da ausência de preconceito, mas, estão apenas interessados em obter audiência a qualquer custo. Não importa se para isso tenham que desrespeitar os direitos das pessoas, como o de privacidade e de julgamento. Além disso, qual o benefício de se mostrar cenas de corpos mutilados? O que nos acrescenta quando um repórter não respeita o momento de luto de uma mãe e pergunta ridiculamente se ela está bem ou o que ela está sentindo? Sem contar que esses programas não são jornalísticos. Não contratam jornalistas profissionais, na maioria dos casos. E muito menos seguem os princípios e técnicas jornalísticas profissionais. Ou seja, assistir esses programas é o mesmo que comer uma refeição feita com a mais baixa qualidade possível. Pode ser fatal.
   6. Não assista programas que façam a apologia a violência. Usando apelações, como do tipo "cadê os direitos humanos" ou "a coisa está cada vez pior, não tem jeito", esses pseudo-jornalistas usam de sentimentalismo e apelam para as emoções, e não para a razão. Incentivam pena de morte, mas não explicam a origem dos problemas. Não são capazes ou não possuem o interesse de explicar o motivo de um bairro ser violento. 
   7. Jornalistas não são juízes. Eles não possuem o direito de julgar nem sentenciar ninguém. Alguns tentam nos influenciar a sentir ódio contra um suspeito mesmo antes de ser levado a juri. Não desenvolvem o senso crítico do expectador. Pelo contrário, apenas nos direcionam para os sentimentos que eles desejam que tenhamos. Não seja massa de manobra.
   8. Novelas, filmes, propagandas e eventos não ocorrem por acaso na televisão. São todos muito bem planejados e procuram seguir os interesses do grupo dirigente. Então, o que está sendo repassado é em grande parte está camuflado. Alguns dizem seus objetivos, porém há sempre objetivos escusos.
   9. Sempre desconfie. Não aceite as informações como verdades absolutas. Só porque passou no jornal tal não quer dizer, necessariamente, que seja a verdade. Nem todos possuem credibilidade. 
   10. Filtre as informações. Não absorva tudo como uma esponja. Tenha senso crítico. Porém, não vá a extremos de acreditar que tudo que existe faz parte de uma grande teoria de conspiração. Na maior parte dos casos, está associado a interesses comerciais, políticos e financeiros.

   As dicas acima são apenas alguns cuidados que podemos ter. Existe muitas questões além dessas. Por exemplo, analisar criticamente o enquadramento, ou seja, qual o foco que uma notícia dá a cada personagem. Cada palavra que eles dizem tem um significado e intenção. Não estão ali a toa. 
   É importante também valorizarmos programas de qualidade e mudarmos de canal quando o apresentador mostra desrespeito. A TV sobrevive da audiência. Ao deixarmos de seguir determinado canal devido suas atitudes questionáveis, estamos afirmando que aquilo que eles fazem é errado. Procure jornais neutros e que tratem o ser humano com dignidade.


De Alexandre Valério Ferreira


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