A gaiola dos homens
Gaiola. Foto: autor. |
João se sentia enjaulado. Na verdade, ele sempre se sentiu assim. Era estranho. Ele estava livre. Podia fazer o que quisesse. Podia viajar para onde desejasse. Não fazia sentido sentir-se assim. Afinal, somos livres. A maioria dos países vivem em governos democráticos. Em quase todos os lugares há liberdade de expressão. Realmente, João devia estar louco.
Loucura podia ser. Quem sabe não fosse ele. Quem sabe fosse a gente. Não sei. Só sei que não fazia sentido. Afinal, ele podia acessar a internet a qualquer hora. Podia falar com qualquer pessoa que desejasse. Talvez nem todas gostassem dele, mas alguém haveria de um dia se agradar com sua companhia. Porque então esse sentimento de prisão? Ele não era nem criminoso. Não cometera nenhum crime. Estava reclamando demais.Podia ter qualquer carro. Podia pegar um avião para qualquer lugar do mundo. Se quisesse, poderia ser agricultor. Se não, podia ser surfista. Quem sabe um escritor? Porque não fazia faculdade? Não havia distinção de cor e condição financeira.
João era sem-teto. Não tinha teto, não tinha nada. Mal tinha o que comer. E o refrigerante que provara era um que tinha no lixo. Água potável? Apenas a da chuva. Viagens? conhecia alguns pontos turísticos da cidade, onde pedia esmola. Expressão? Não sabia nem ler, quanto mais escrever. E, se soubesse, onde se expressaria? Nos jornais não o aceitariam; ele era muito revoltado com o sistema. Se escrevesse nos muros, seria preso por vandalismo. Terras não tinha. Ninguém doava para ele. Para tudo precisava de dinheiro. Só as praias eram e públicas. Aliás, nem todas! Realmente, vivia numa gaiola.
Alexandre Valério Ferreira
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