Aceitação
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Não era onde queria morar. Não era um sonho. Talvez fosse um pesadelo. Quando relembrava como veio parar ali, simplesmente não conseguia entender. Não entendia como veio e nem pra onde ia. Muito menos era possível compreender como chegou a se acostumar com aquela vida durante uma década. Parecia uma grande loucura.
Ele veio do interior do Ceará. Por falta de emprego e condição financeira, decidiu fugir para a capital. Todos falavam da beleza da cidade e da riqueza de oportunidades da metrópole. Pode até que seja verdade, mas esqueceram de destacar um ponto. O problema era a moradia. Fortaleza sofreu com o êxodo rural e a impressionante desigualdade social, marcante no estado. Gente demais, moradias de menos. Era assim a vida na cidade grande.
Os preços das casas eram altos e a cidade era cada vez mais ocupada. Restava então procurar um meios alternativo. Triste descobrir que a outra saída não era nada agradável: morar em favela, invadir terrenos. Mas, ele, influenciado por amigos, decidiu invadir um espaço que os deixaria relativamente afastados da sociedade em geral (seria proteção? Seria medo?). Era um conjunto de casas que beiravam um canal em um bairro de periferia.
O canal já foi um rio, mas foi concretado e se transformou em um imenso esgoto a céu aberto. Que triste. Ele amava tomar banho de rio. Neste era impossível! O odor era forte. Incrível foi notar que com o tempo ele se acostumou com a situação. Parece que quando vivemos uma rotina, acabamos nos tornando passivos, aceitando a vida com é e perdendo as forças para quebrar as paredes que nos trancam. Tanto era que seu olfato se tornou insensível aos mais diversos odores (já não aguentava mais, talvez...). E, assim, se passou uma década.
Bem, um dia andando pela cidade, decidiu parar e pensar um pouco em uma praça arborizada. Era incrível que no meio da metrópole, um local assim tivesse um clima tão ameno. Parecia que era no campo! Como era boa aquela vida. Lembrou-se então do seu interior, do seu passado e das suas alegrias. O que ganhara aqui? Vida agitada, barulhenta, sem expectativas, sem perfumes.
Voltou com uma decisão: retornar para seu interior. Parecia loucura. Tinha família. Mas do que adiantava deixar os filhos num ambiente daqueles? Corria o risco de se acostumarem com a falta de esperanças. Não! Não seria assim! Com as poucas economias que tinha, conseguiu levar a família de "volta para casa". Descobriu que a vida lá estava melhor, tinha emprego e melhor estrutura. E o melhor: o rio ainda era limpo e a região, verde. Agora, podia até notar que algo fedia ou não!
Alexandre Valério Ferreira
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