Diário de uma Árvore
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UMA placa informa: "Árvore da Preguiça". Dizem que sou tão preguiçosa que decidi crescer deitada, para evitar a fadiga e o esforço de ficar em pé. Uma tremenda calúnia, a meu ver. Depreciam minha pessoa e escondem a verdade dos fatos.
Não estou deitada à toa. Se pensa que foi de vontade própria que assim vim estar, informo-te que estas completamente enganado. Cresço na horizontal devido a forças que estão além do meu controle. Sobrevivo contra a correnteza que me fez nascer nessas terras.
Sou um mangue-de-botão. Amo a combinação de praia, sal, água e lama. Mas, não estou entre os meus. Sou quase um asceta, um eremita. Vivo na solidão das dunas do Preá. Claro que tem outros como eu por aqui, porém, eu sou um sobrevivente único, especial.
Contra minha vontade de crescer e alcançar as nuvens, vieram as forças dos ventos e do sol. Sem apoio de amigos, tive que persistir na minha luta pela existência, catando água e nutrientes neste solo incerto.
Há alguns anos, foi necessário mudar os planos. Tive de me inclinar. Deixei a vertical para ir pela horizontal. Desistiria? Deixaria de lutar por conta de um orgulho besta? Morreria por causa da arrogância? Não, não e não!
Viver é coisa complicada, bem dizia Riobaldo no Grande Sertão: Veredas. De fato, ela é. Não quer dizer, entretanto, que seja totalmente ruim. Desafios podem virar aprendizado. E com ele, podemos ser mais do que imaginávamos que poderíamos ser.
O vento me entortou. As chuvas me curvaram. Mas, ninguém me derrotou. Nem mesmo o poderoso Sol. Continuei crescendo. Não para os céus, é claro, mas para o horizonte. Agora meu alvo era a Pedra Furada. Cansei de nuvens, eu quero é desafios.
Quando reflito sobre minha saga, fico a pensar os benefícios que tive por meu "defeito". Acabei me tornando a árvore mais fotografada de Jericoacoara (na verdade, é praia do Preá, mas dá na mesma). Se eu fosse como todas as outras, teria recebido tanto destaque? Alguém teria lembrado de mim?
Eu brinco ao afirmar que me chateia ser chamada de árvore da preguiça. Quando as pessoas veem me ver, percebem em meu tronco as marcas da minha luta. Enroscados entre minhas raízes e galhos, são inspirados por minha resiliência e atraio fãs e fotógrafos.
Virei um popstar. Minhas fotos rodam o mundo e o mundo roda a minha volta. Turistas de todos os cantos da Terra visitam não apenas a Pedra Furada, ícone maior da região, mas veem me observar e se encantar com meu caule tortuoso, mas resistente. No final, o mal veio para o bem. A vida é cheia dessas coisas. Por isso, sempre digo: resiliência é preciso.
De Alexandre Valério Ferreira
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