Sinal Amarelo



Por Alexandre Valério Ferreira


O AMARELO DE REPENTE tomou-lhe de conta. O verde, antes tão vivo, agora sucumbia, abafado pela coloração vibrante que nesta época do ano se fazia presente. O ipê se desfazia de árvore para tornar-se buquê de flores. Com o vestido dourado, viçoso, iluminava a cidade, espantando por algumas semanas seus insuportáveis tédios.
  Entretanto, o amarelo que alertava-se presente nem sempre era ouvido. Não eram todos os olhares que por ele se prendiam. Não que não fosse belo, majestoso, singular. Longe disso. Na verdade, a questão eram os olhos destreinados dos seus vizinhos. Sempre tão preocupados com "coisas sérias", esses não tinham tempo para uma pausa sequer.
   Havia, por outro lado, uma garota diferente na via. Não daquelas que vivem com pescoço inclinado para o chão, caçando curtidas e comentários nas redes sociais. Também não era daquelas que perdiam-se nos medos e inseguranças, tímidas demais para levantarem os olhos, fugindo da vigilância dos estranhos.
   Não, esta era diferente. Tinha um olhar firme, colorido, vibrante. E foi através de suas pupilas que o tom dourado cruzou-se naquela manhã de uma terça-feira monótona. A retina dela alertara seu universo: "que coisa linda aquela árvore". A mente - até então distraída com assuntos triviais - agora focava-se no amarelo que lhe clamava atenção.
   As flores existem para chamar a atenção. Não que os ipês necessitem de nossos aplausos para sobreviverem (ou talvez precisem, quem sabe?). Mas o tom amarelo que atrai diversos polinizadores. As abelhas, em especial, fazem o papel vital de perpetuar as angiospermas.
   A garota parou. Esperou o sinal ficar amarelo e, em seguida, vermelho. Atravessou na faixa e seguiu para o canteiro central, onde um belo ipê amarelo governava. Seu reino de flores vestia o chão de um tapete dourado, digno de reis. 
   Como uma princesa na selva de pedra, a garota sentiu-se tal qual a realeza a fazia sentir-se. Por alguns instantes, entre um ônibus e outro, ela vislumbrou o magnífico ipê. Este chovia nela. Jogava-lhe pétalas, como se fosse um casório ou uma coroação. 
   Os carros passavam. Os ponteiros do relógio giravam. O semáforo coordenava o tráfego. Pessoas iam para o norte, sul, leste, oeste. As nuvens corriam lentamente. Os raios solares fortaleciam-se. O vento varria as flores para o asfalto. O tempo passava.
   Hora de ir embora. A garota pegou algumas das flores que estavam no chão. Mas, o ipê insistiu que ela levasse uma das que ainda estavam no ramo, as quais carregavam mais vivacidade. As caídas já tinham feito seu papel. Não desejavam mais atenção. Ao contrário destas, as que sugavam da seiva da vida ainda esperavam sua hora de arrasar.
   Foi-se embora a jovem, então, com uma bela flor amarela por entre os cabelos. Polinizaria o ipê mundo afora, vicejando sua beleza e aroma, atraindo olhares para a flor símbolo do Brasil. Quem sabe assim não salvaria tantas outras de serem cortadas ou convenceria alguém de plantá-las também?
   Ao lado do seu ouvido, as pétalas lhe sussurravam expressões de afago, trazendo para o coração da moça uma calmaria irresistível, surreal, transcendente. De repente, os dias pareciam mais verdejantes e as cores, mais vibrantes. Então, ela parou. Atenção: sinal amarelo!


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