Dia de azar
De Alexandre Valério Ferreira
Jorge está irritado porque acordou tarde (como se fosse culpa do relógio e não da festa a qual ele foi ontem).
Jorge está irritado porque feriu seu dedão no armário do seu quarto (como se o armário tivesse se deslocado sozinho para uma posição que o permitisse machucar alguém).
Jorge está irritado porque não tem leite em casa (como se alguém o tivesse impedido de comprá-lo ontem a noite no mercantil).
Jorge está irritado com um homem que tem um carro novo (como se todos comprassem carros para humilhar unicamente a ele).
Jorge está irritado porque não aprovaram ele no teste de direção (como se fosse obrigação do examinador aprová-lo).
Jorge está com raiva da mulher que não respondeu ao sorriso "charmoso" dele no ônibus (como se fosse a obrigação dela ter que agradá-lo).
Jorge está com raiva porque o sinal de trânsito está vermelho logo agora (como se o sinal tivesse maquinado o mal apenas para atrasar única e exclusivamente à pessoa do Jorge naquele exato momento).
Jorge está com raiva porque pisou numa poça de lama (como se apenas ele sofresse com isso).
Jorge está com raiva porque acabou os créditos justo na hora em que ele fazia uma ligação (como se alguém tivesse apenas esperando a hora de ele ligar para expirar seus créditos).
Jorge está com raiva porque a gripe o pegou (como se ela tivesse personalidade e procurasse irritar justamente os mais estressados).
Jorge está com raiva porque sua fila no banco está enorme (como se fosse apenas ele que estivesse nela).
Jorge está com raiva porque parece que tudo está dando errado (como se o universo tivesse feito um complô somente contra ele, pois, afinal, ele é o centro e base de tudo no mundo...).
Jorge não está com raiva em dizer que foi um dia de "azar" (como se ele realmente soubesse alguma coisa).
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