As Janelas e as Cercas



AS CERCAS CONSTITUEM-SE um símbolo. Não estão ali para, de fato, proteger. Na verdade, possuem um significado e, portanto, transmitem uma mensagem. Dizem que existe um espaço ao qual nem todos podem ter acesso.
  Bem, pelo menos assim elas eram: somente símbolos. Representavam a propriedade privada. A cerca coibia apropriações. Alertava aos que ousassem ocupar uma área de que dono o local tinha. Poderia não estar lá ou nem ao menos se lembrasse daquele pedaço de terra. Ainda assim, aquilo era de alguém e, portanto, não poderia ser usurpado. Talvez comprado, mas nunca apropriado sem a permissão dele.
   A cerca era um horizonte para as janelas. Aquelas diziam a todos que as portas estavam abertas e havia liberdade de se movimentar, mas até um determinado ponto. A cerca é a representação dos limites, das proibições, do controle.
   Um presídio, uma fazenda ou uma casa do interior costuma ter cercas. O hábito veio para as cidades grandes, porém, não como mero símbolo ou alerta, e sim como uma medida para conter o perigo real de uma invasão. No ambiente urbano, a cerca só funciona quando fere. Não basta alertar.
   A cerca é também símbolo de muitos problemas sociais. Dizem que a grande questão do Nordeste não é a seca, mas a cerca. Ferramenta de limitação, de intimidação, de apropriação dos grandes latifundiários diante de uma enorme massa desprovida de recursos ou de direitos.
   Nem sempre a cerca permanece em sua forma original. Pode evoluir para muros ou muralhas vigiadas. Estes indicam que existe uma área inacessível e, se fosse pela vontade do seu dono, intransponível. O muro é a cerca.
   A questão que fica é: estamos nos protegendo em cercas com mais e mais frequência. Tememos o outro. Queremos a nossa liberdade limitada, tanto social como fisicamente. E quanto mais nos protegemos dentro do arame farpado, mais ferido o mundo fica. 
 Segregado e dilacerado por ilhas que presunçosamente afirmam ser autossuficientes. Triste é ver o momento da desilusão, ao perceberem que o problema nem sempre vem de fora. Ou pior, que o problema é resultado do medo do problema.


De Alexandre Valério Ferreira

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