Diário do relojoeiro
Casa do relojoeiro, Helena Coelho.Imagem: pinturasnaifdehelenacoelho.blogspot.com.br |
Dentro de sua casa, não havia espaço nas paredes. Era tudo ocupado por relógios. Haviam diversos modelos. Alguns eram simples, redondos ou quadrados. Outros, eram bem diferentes, bem trabalhados, com detalhes entalhados, cucos ou bonecos. Eu gostava especialmente daqueles enormes relógios com pêndulo. Sempre quis ter um.
O relojoeiro era um cara calmo, de poucas palavras. Na verdade, parecia que tinha vergonha das pessoas, pois atendia os clientes olhando apenas para algum local ou para o relógio que precisava consertar. Raramente olhava para o freguês. Todos sabiam que ele era assim. Em compensação, ele fazia um excelente trabalho. Era muito eficiente.
Ele trabalhava o dia inteiro. Ele consertava todos os tipos de relógio. Mas, tinha preferência pelos analógicos. Alias, quase todo mundo prefere os relógios analógicos. Porque? Talvez por serem mais exatos, confiáveis, eficientes. Talvez seja pela beleza do movimento dos ponteiros. Ou, como o relojoeiro me disse uma vez, a gente sente que o tempo passa quando vemos o deslocamento dos ponteiros. Isso não ocorre no relógio digital, com sua tele cristal líquido ou com visor de LED.
Quando dava uma hora completa, era uma barulheira na casa do relojoeiro. Estranho era ver sua alegria. Porque seria? Talvez por confirmar seu bom trabalho. Afinal, todos os relógios soavam os alarmes exatamente no mesmo instante. Era realmente tudo sincronizado, comprovando a qualidade do trabalho daquele velho trabalhador. Era vida dele.
Mal percebia ele, (Alias, talvez percebesse) que aquele pequeno equipamento, aquele contador do tempo, tinha enorme poder. Como assim? Os relógios que ele consertava eram equipamentos que controlavam a vida de muitos. Sim, o relojoeiro tinha nas mãos o poder de adiantar ou atrasar a vida de alguém. Se errasse, poderia fazer alguém perder uma viagem, um emprego ou um grande amor. Quem sabe? Não foram 5 minutos de atraso que fizeram o rapaz da história de José de Alencar conhecer Carlota e se apaixonar?
Alexandre Valério Ferreira
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