O Livro que Caiu
ESTAVA precisando ler algo novo. Queria algum livro de ficção ou um romance. Infelizmente, os mais interessantes já estavam emprestados. E não gostei dos que restaram. Como ainda restava tempo até pegar o busão, decidi vasculhar as estantes sem compromisso.
Olhava desatentamente as placas que identificavam os assuntos que haviam em cada corredor. Deslizei minhas mãos entre as capas. Algumas, eram lisas. Outras, rugosas. Mas todas levemente empoeiradas. Decidi parar de usar minha mão como espanador.
Quando entrei no terceiro corredor, já exausto e desmotivado, senti que esbarrei em algo. Na verdade, eu chutei alguma coisa que deslizou para debaixo da estante. Eu me abaixei e tentei encontrar. Meus joelhos fizeram um estalo assustador. Preciso fazer cirurgia para ajeitá-los.
Não via nada. Até pensei em deixar para lá. Depois alguém o pega e recoloca na estante, pensei. Mas, aqui isso demoraria para acontecer. Foi culpa minha, então estiquei o braço e tentei pegar o bendito livro.
Consegui! Era preto. Estava com a capa amassada. Olho para os lados a procura do local de onde ele veio. Mas, não o acho. Penso em levá-lo para o bibliotecário. Eles entendem bem esses estranhos códigos identificadores. Para mim, os livros deveriam ficar em ordem alfabética. Bem mais simples.
Folheei o livro. Estava todo rabiscado. Cheio de notas. Alguém gostou muito do que leu ou achou muitos erros. Fiquei curioso.
"Vai levar?" - perguntou um rapaz com cara amarrada que se forçava a trabalhar no balcão.
"Hum... não, não... " - daí, nessa confusão, mudei de ideia - "sim, sim"
"Digite a senha" - sussurrou o atendente.
Era um livro de sociologia. Minhas notas são boas nessa matéria. Porém, não costumo ler nada além do que os professores cobram. Ainda mais sobre a sociedade. Todos sabem que o mundo é louco.
Mas, o livro falava da sociedade de uma forma diferente. Não era como aqueles pesquisadores metidos a sabe-tudo. Na verdade, o autor disse que o estudo de sociologia não é propriedade exclusiva dos sociólogos. Nas mais diversas atividades humanas, principalmente nas artísticas, encontramos olhares aprofundados do ser humano e da sociedade.
Será que sou um sociólogo também? O máximo que sei da sociedade é que ela é complicada. Até mais do que a matemática, a física quântica e a química avançada. É tudo caótico ou pelo menos me parece assim.
É proibido escrever nos livros. Mas, aquelas notas escritas com lápis foram essenciais para eu entender aquele livro. Elas tinham o significado de palavras difíceis, detalhamento de algumas informações passadas por alto e até indicações de onde encontrar mais sobre o assunto.
Era engraçado, pois as minhas dúvidas pareciam ter sido as mesmas da pessoa (ou, das pessoas) que leu o livro antes. Era assustador, às vezes. Em outros momentos, eu dava uma risada sozinho. Parecia que eu estava na companhia do leitor(a) anterior. Foi uma experiência incrível.
Nunca descobrir de quem era aquelas notas. Eram bem organizadas e a letra era bem redigida. Talvez fosse de uma garota. Mulheres costumam ser mais dedicadas que os homens em nossa cultura. Mas, tem amigos meus que são muito estudiosos e também amam anotar em todos os cantos.
Passei a fazer anotações também. Com o tempo entendi o benefício. Quando anotamos no papel, na verdade, estamos também anotando na memória de nossas mentes. E também é uma medida de segurança, pois podemos esquecer algo valioso. E pensar que tudo isso foi por causa de um desobediente leitor (a) da biblioteca.
De Alexandre Valério Ferreira
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